Livros de arte por um lado e a arte de fazer livros por outro. Os livros, sem dúvida nenhuma, sempre caminham lado a lado com a arte e muitas vezes se confundem com ela própria, como é o caso, por exemplo, da categoria ambivalente dos livros e cadernos de artistas.
Durante muito tempo os livros especializados em arte ou que portavam reproduções de obras de arte fizeram o papel do “museu imaginário”, descrito por André Malraux, entre os anos 50 e 60.
A fotografia, enquanto dispositivo tecnológico acabou substituindo os esforços da gravura na função de povoar os livros com reproduções de pinturas, esculturas e de construções arquitetônicas, de diversas épocas e de toda parte do mundo, possibilitando o conhecimento virtual/imagético da produção artística entre povos de várias culturas.
A fotografia, enquanto dispositivo tecnológico acabou substituindo os esforços da gravura na função de povoar os livros com reproduções de pinturas, esculturas e de construções arquitetônicas, de diversas épocas e de toda parte do mundo, possibilitando o conhecimento virtual/imagético da produção artística entre povos de várias culturas.
Se por um lado o ofício do livro de arte é o de transmitir e disseminar o conhecimento de obras por meio de imagens, há outra categoria que não deve ser esquecida, em que o ofício da arte – e não apenas em sentido artesanal – está na confecção do próprio livro.
Luisa Gomes Cardoso
Bispo do Rosário, caderno de artista de Eduardo Denne, Canteiro de Alfaces e Caza Arte Contemporânea |
Já, tratando-se de cadernos e livros de artistas, estes configuram uma categoria híbrida de objetos de arte, uma vez que tanto, pode ser interpretado por seu valor estético quanto por seu viés literário.
Mais antigos do que se imagina, os cadernos de artistas figuram na história da arte, sobretudo, como preciosos testemunhos para as corajosas aventuras de além-mar, envoltas pela fumaça inebriante do ópio. Descritos através de imagens e palavras precisas, os cadernos de artistas expõem o exotismo e a sedução das culturas dos povos não pertencentes ao velho mundo. É o caso dos cadernos de viagem ao Marrocos de Delacroix, produzidos em 1832.
Menos desbravadora, mas, não menos tocante, está à poesia encontrada nos desenhos que cobrem inteiramente as páginas dos cadernos de Turner. Rápidas impressões atmosféricas, esboços, e croquis, que atestam toda elegância dos traços do artista.
Para abordar os livros de artista, enquanto categoria objetual é preciso mencionar o estabelecimento da Arte Conceitual. Inúmeros foram os trabalhos realizados com esta concepção de livro-objeto, e que atravessaram a década de 60, até os dias de hoje.
Poder-se-ia citar, artistas de várias partes do mundo que deram grande contribuição, como por exemplo: Robert Filliou, e seu Poussière de poussière, n. 30-100, de 1977, além de artista alemão Joseph Beuys com Evervess II, de 1968, só para citar alguns artistas que fizeram parte do coletivo Fluxus.
No Brasil, é imprescindível citar, dentro dessa categoria, artistas de peso e importância histórica como Waltércio Caldas e Paulo Bruscky, além do artista luso-brasileiro Artur Barrio, que chegou a produzir durante a década de 70, os cadernoslivros.
Este conceito de cadernos-livros é ironicamente explicitado por uma das muitas frases dispersas encontradas nos objetos e que diz o seguinte: "CadernosLivros não são diário de artista".
Talvez não haja, de fato, esse tipo de intimidade, nem de aproximação na obra de Barrio, muito embora, se trate de uma obra complexa e sensorial. Fato que se comprova na elaboração do famoso trabalho “Livro de carne”, de 1978-79, que vem a exemplificar a categoria dos livros de artistas. Talvez um dos mais impactantes e estudados da história da arte brasileira. Visceral como a maior parte das obras de Barrio, o livro feito de carne, atesta com sangue e matéria sujeita à putrefação, a crítica social e política e aborda destemidamente a institucionalização da arte, criando uma obra que se desfaz diante do próprio público, apelando a todos os sentidos.
A escritora e poetisa Ana Cristina César, dizia que seus escritos funcionavam na verdade como cardemos terapêuticos. Nada mais distante da brutalidade orgânica das obras de Artur Barrio, oriunda, em parte, dos dias de repressão sociopolítica e ideológica.
Livros de artistas e cadernos de artistas, livros de arte e a arte de fazer livros, temas e pares que se misturam, se penetram, e por fim se apartam, revelando uma pluralidade quase infinita de formas, funções e significados que ampliam os sentidos e escapam do óbvio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário