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  • sexta-feira, 9 de novembro de 2012

    RESGATANDO A IDENTIDADE - Zona Oculta documenta a produção feminina nas artes visuais

    Em uma sociedade onde o machismo está velado diariamente – no trabalho, na economia, na cultura, na política e, principalmente, dentro de casa – iniciativas como esta fazem toda a diferença. Sentido falta da presença feminina no campo das artes visuais, as artistas plásticas Helena Wassersten, Lúcia Avancini e Marilou Winograd  idealizaram, em 2004, o projeto Zona Oculta – Entre o Público e o Privado. O objetivo é resgatar a história feminina dentro das artes visuais.

    Realmente é difícil encontrar mulheres artistas ao longo da história da arte. A mexicana Frida Kahlo (1907-1954) e as brasileiras Anita Malfatti (1889-1964) e Tarsila do Amaral (1890-1973) foram algumas que lutaram muito para ter seus direitos reconhecidos e sua arte valorizada. O assunto virou até tema de pesquisa. 

    Ramile Leandro em seu artigo “Vitimação Feminina na Vida e na Arte” afirma que a mulher artista plástica sempre foi vítima de preconceito: “Desde o inicio do ano de 2007 venho pesquisando sobre a mulher, no papel de artista, ao longo da História da Arte, mais precisamente da Idade Média à Contemporaneidade, e o que encontro são artistas oprimidas, que nunca tiveram seu trabalho reconhecido, ou até o tiveram, mas assinados por homens, pois essa era uma profissão para eles e não para elas”, declarou. 

    Ainda de acordo com a pesquisadora, a mulher sempre foi tratada como objeto: “No entanto, não me choquei com os resultados parciais da pesquisa, que se encontra em andamento, visto que quando ouvimos falar nos "mestres da pintura" ou em qualquer outra forma de manifestação artística, o feminino não é quase mencionado na posição de autora, mas sim de objeto representado”, dispara.

    Criado por três mulheres, o projeto Zona Oculta já faz parte do calendário de artes visuais do Rio de Janeiro e se tornou referência no tema. Em quase 10 anos de existência, recebeu trabalhos de mais de 100 artistas e foi visitado por 40 mil pessoas. As três primeiras edições foram realizadas no Conselho Estadual dos Direitos da Mulher (CEDIM), em Nova Iguaçu (RJ), em parceria com o SESC. A demanda acabou levando o evento para o Centro Cultural da Justiça Federal e para o Largo da Carioca.

    “Apesar das inúmeras dificuldades para manter o evento, estas são enfrentadas, uma a uma, com a certeza da importância deste fazer e sua contribuição histórica. Com vivências diversas, juntas se propõem a ações e provocações democráticas no que se refere a questão de gênero dentro do circuito da arte contemporânea. Sem vínculo com instituições, o objetivo é colocar em evidência e mapear a produção das artistas mulheres com total  liberdade tendo como critérios a diversidade seja  de linguagens, grupos e idades”, explica uma das coordenadoras do evento Lúcia Avancini.

    Para saber mais acesse: http://www.zonaoculta.com.br/

    Chandra Santos

    ARTIGO - Escrevo-lhes após 2 noites. O real papel da Arte

    Neste momento em que você lê estas linhas, saiba que lhe escrevo de muitos anos atrás, mesmo que todo este tempo se resuma a 5 dias.  Agora é a madrugada de domingo para segunda, após 2 noites em claro, na montagem de um projeto que irá mudar minha vida e de alguma forma,  a vida de muitos, espero.   

    Neste momento todas as apostas foram cumpridas e a ARTIGO Rio Feira de Arte Contemporânea tornou-se uma realidade.   Sua proposta de democratização ao acesso a arte, de ponte entre a produção cultural e o público, de difusão do trabalho de novos artistas está em pleno vigor.

    Neste momento muitos anos de minha vida se tornaram uma proposta para o futuro e tudo aquilo que acredito tornou-se meu legado , algo que permanecerá - esta ilusão existencial de onde todo artista tira suas forças para enfrentar noites em claro.

    Durante o período em que planejei, lutei, compartilhei,  convenci  e venci os pré-conceitos sobre minha idéia de uma nova forma de se relacionar com a arte, constatei o quanto a redoma que a protege também a sufoca.   Quando lancei o projeto de uma feira que apresentasse obras para todas as pessoas, a resposta a esta proposta de democratização foi muitas vezes a ironia, o lugar comum.  Feira para classe C, arte em liquidação e outros,  foram alguns carimbos recebidos sem que nunca estes conceitos restritivos fossem nossa apresentação.   A ARTIGO Rio, sempre foi uma proposta de inclusão  e não de delimitação. 

    Queremos dizer que arte é um direito de todos e que o seu real  papel é ser democrática.

    Portanto,  que venham todas as pessoas, independentes de qualquer parâmetro e acima de qualquer conceito.

    Estamos em plena festa, em júbilo por que nos foi dada a coragem de sonhar.  E sonhos assim levam muitos e muitos anos para se tornarem um sonho comum, mesmo que poucos dias par se tornarem realidade.
    Sejam bem-vindos !



    Alexandre Murucci

    Curador e realizador do festival

    EXPOSIÇÃO - O artista como agente de transformação




    A efervescência em que se encontra a arte no Rio de Janeiro é ímpar não apenas no que se refere ao seu aspecto mercadológico, mas também quanto à formação de frentes alternativas ao seu tradicional conceito de, digamos, divisões de tarefas. Para que fique bem entendido, a especialização no meio artístico sempre posicionou distintamente seus agentes entre aqueles que produzem, os artistas, aqueles que vedem, os galeristas, marchands, art dealers/advisors, etc. e aqueles que formam opiniões, críticos, curadores, historiadores, entre outros. Entretanto, um fenômeno cada vez mais pontual é a presença de artistas em atividades que não meramente a produção de sua obra. Não raro são os casos em que temos artistas curadores, galeristas, pesquisadores. Isso não é por acaso. O artista de hoje busca se aprofundar, conhecendo do seu ofício não só a fatura. Muitos, além da graduação, estão de volta às universidades para pós-graduações; são mestres, doutores, ou ainda professores com uma particularidade: estiveram ou estão na linha de frente das ações artísticas, travaram ou travam o verdadeiro embate corporal diante da criação. Por consequência, abrem-se horizontes de autonomia que lhes permitem transitar em territórios cujas fronteiras simplesmente vão-se diluindo pouco a pouco. Já vai longe o tempo em que artista ficava recolhido em seu ateliê à espera de sua musa. O discurso de que artista não se representa está ficando desbotado e ultrapassado. Isolamento, definitivamente, não está mais para o vocabulário do artista contemporâneo.


    Diversos são os sinais de mudança que vemos surgir na cena carioca das artes visuais, por exemplo. Circuitos independentes e com agenda definida estão se formando com força e eficácia como é o caso do Circuito Oriente em Santa Teresa composto de espaços que abrigam não apenas mostras particularizadas de seus integrantes, ao contrário, apresentam em exposições diversificadas tanto novos quanto já estabelecidos artistas em sua programação. Esta página de jornal mesmo é uma ramificação do projeto CAZA Arte Contemporânea que inicialmente ocupava um espaço físico no centro da cidade e que hoje tem múltiplos desdobramentos. A galeria Cosmocopa Arte Contemporânea, em Copacabana, a qual possui entre seus sócios dois artistas que, além de donos, fazem parte do seu elenco, é outro diferencial que se apresenta. E o mais significativo sinal de mudança que vejo é a ARTIGO Rio Feira de Arte Contemporânea toda concebida por um artista visual, hoje dito visionário, mas que é na verdade um desbravador, e que leva consigo a responsabilidade de abrir novos caminhos em toda a complexa transformação por que passa o sistema das 
    artes.

    Ainda há muito por vir, ver e vencer, porém a cada novo desafio aceito, o artista se distancia exatamente da acomodação e do determinismo de velhos fundamentos e amplia sua contribuição para mexer com os neurônios dos conservadores.

    Fotos: Obras de Julio Ferreira Sekiguchi, Roberto Tavares e Osvaldo Carvalho



    Osvaldo Carvalho

    Artista visual, mestre em poéticas visuais pela ECA-USP e curador independente