sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

CRÍTICA - Kitty Paranaguá: Copacabana



A fotografia está no campo da imagem técnica, aquela que usa uma máquina para chegar ao resultado final. Baudelaire disse que ela nunca chegaria à condição de arte. Ele, infelizmente, não teve a oportunidade de conhecer a produção imagética de Kitty Paranaguá. Essa artista, que usa a fotografia como meio de expressão, presenteia-nos sempre com uma sacada sensível, poética e inteligente, ao mesmo tempo que se preocupa com um resultado estético de enorme coerência e felicidade para quem está frente a suas imagens. Arte, com certeza; mas não por serem imagens belas – elas vão além. Num primeiro momento, suas fotos procuram traçar uma crônica sobre um dos lugares mais famosos desse planeta, a Praia de Copacabana, e, em seguida, a artista nos coloca dentro de seus devaneios poéticos, em uma Copacabana que não é um lugar geográfico, mas um lugar dentro de todos nós.

Imagens que falam de muitas Copacabanas, paixões, belezas, mistérios, crenças, humores, relações. O que ela nos apresenta é da ordem do humano, e vemo-nos deslocados para dentro de suas fotografias como se lá estivéssemos de sandálias, corpos salgados e muita areia. A artista procura construir imagens carregadas de um deleite estético, pontos áureos, simetrias, perspectivas bem estruturadas, pontos de fuga; ela nunca abandona o posto de hábil fotógrafa e realizadora de belas imagens, mas essa condição não lhe basta. Ela precisa nos atingir além do prazer retinal, procurando um contato mais íntimo, próximo e profundo.

Não vemos na obra de Kitty uma mensagem empacotada, encerrada; muito ao contrário, ela procura abrir caminhos, deixando mais dúvidas que certezas, numa verdadeira obra aberta. Sua produção aponta para uma preocupação de nos atingir em nossa própria essência, naquilo que somos; partir de um ponto geográfico para chegar à natureza humana, aquilo que nos conecta e nos forma, que faz de nós homens e mulheres. Este é o desafio poético da artista, o que ela, muito habilmente, vem há anos procurando realizar.

É fácil ficarmos envolvidos pelo apelo visual extraordinário de suas fotos e, com isso, corremos o risco de só usufruir parte da mensagem da artista. Se continuarmos atentos, observando suas imagens, perceberemos que ela abre um canal de diálogo, deslocando-nos para dentro de nós mesmos. A fotografia de Kitty Paranaguá, ainda que não seja sua preocupação, cala quem, ainda preso a preceitos modernistas, preocupa-se mais com o suporte e a técnica, relegando a fotografia a um plano inferior, dos técnicos e não da arte. A imagem apresenta-se, incrivelmente, como algo que, mesmo carregado de extraordinário rigor técnico em sua construção imagética, ultrapassa este ponto em busca de uma reflexão daquilo que nos constrói, levantando dúvidas, fazendo perguntas e, felizmente, não deixando resposta definitiva para nada, convidando-nos a fazer parte dessa autoria.



Marco Antonio Portela

Artista Visual, Mestre em Arte, Curador independente e idealizador do MAP (www.museudeartepostal.com.br)

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