Gabriel Amorin
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Performance de Ronald Duarte Nimbo/Oxalá. Ara-Baba Ara Ejá Ô Doia, 2 de Fevereiro de 2011, Arpoador. |
Segundo a filósofa francesa Anne Cauquelin, uma obra em site specific […] Produz o lugar que ela mesma ocupa e se confunde com ele. Essa vinculação a define enquanto obra de site specific. (CAUQUELIN, 2008. P.74). E, essa “vinculação” é que revela seu próprio significante.
Boa parte das intervenções urbanas realizadas pelo artista visual Ronald Duarte, não podem ser repetidas em qualquer lugar, pois elas necessitam de um contexto/context, a ser escolhido, construindo uma especificidade, fato que as classificam, inevitavelmente, como obras de site specific.
Somente a ação “Nimbo Oxalá”, já foi executada mais de 20 vezes, ganhando significados diversos. Em parte, pela escolha diferenciada de seu repertório material e semântico. A ação que já foi realizada em Cuba por ocasião da Bienal de Havana ocorrida em 2009, diante do paredão onde Fidel Castro ordenou a execução de seus opositores, poderia ganhar outros significados políticos adicionando novas interpretações à obra.
Em contraste, encontra-se a ação ARA BABA ARA EJÁ Ô DOIÁ!!!!, mais uma versão de “Nimbo Oxalá”, desta vez, executada num pequeno barco, no dia de Iemanjá, ganhando por isso, o nome diferenciado, oriundo da mistura dos dois orixás (Oxalá e Iemanjá). Nesta ação, a tradicional nuvem formada pelo Co², curiosamente desce ao nível no mar, criando um efeito visual inesperado que tornou a ação única em relação às outras versões. A fumaça que simbolizava a nuvem de Oxalá foi atraída para as águas de Iemanjá, numa perfeita comunhão, justificando a homenagem, e mais uma vez, agregando significados cada vez mais heterogêneos à ação. O artista inseriu nas demais intervenções urbanas, elementos cada vez mais complexos de uma iconografia extraída das religiões afro-brasileiras (Umbanda, Quimbanda, Candomblé, etc.), o que revela um jogo ativo e a negociação com o aparato simbólico e cultural decorrente de um processo de hibridação - multiculturalismo.
Nas palavras de Ronald Duarte, a relação afetiva com o local, e a necessidade de se fazer uma reflexão sobre questões urgentes, é imprescindível como recurso poético que visa abordar a vida em sua dimensão simbólica e estética.
Essa relação que também foi apontada a partir da obra de Hélio Oiticica, e que também pode ser encontrada em artistas contemporâneos como: Romano, Cabelo, Jarbas Lopes, Alexandre Vogler, entre outros, novamente reforça a ideia de uma “tradição” carioca, de pensar as “ruas”, os “sítios”, como elemento vivo e participativo da obra, desencadeando poéticas que reelaboram uma concepção de espaço físico, mítico e psicológico, e que desta maneira, repensam as questão de identidade, fronteiras e territórios.
Doutoranda pelo PPGAV-UFRJ. Crítica de arte e curadora independente.
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