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  • sexta-feira, 15 de junho de 2012

    NIVALDO CARNEIRO - Tão boa quanto a que tem nos livros

    GUGU - DADÁ, Releitura bem humorada de Nivaldo Carneiro

    Segundo Pierre Francastel, o objeto de arte pertence a uma atividade do espírito que está intrinsecamente ligada ao processo criativo. Pensando na versatilidade do processo criativo e na consequente especialização sígnica é que serão analisadas três obras recentes do artista plástico Nivaldo Carneiro. “Tão boa quanto a que tem na lata” é uma assemblage de conceitos extraídos diretamente das páginas 50 e 51 do livro “Arte Contemporânea: uma história concisa” de Michael Archer, e põe em prática o seguinte princípio: “o que se vê é o que se vê”. O artista deixa explícitas as influências de movimentos como a Minimal art, a Pop art e a pintura abstrata ao entoar as palavras de Frank Stella: “Eu quero produzir uma pintura que permita a tinta ter uma aparência tão boa quanto a que tem na lata”.

    Plastipopstellianas,
    tão boa quanto a que tem na lata
    Dando continuidade a uma linha jocosa de pesquisa dentro da história da arte, o artista investe em trocadilhos para criar obras como, “Merzbaudes”. O neologismo sagaz se refere ao “Merzbau” (Merz building) obra do artista alemão Kurt Schwitters, concluída em 1933, na obra de Nivaldo Carneiro, o que se vê é um conjunto de baldes que foram empilhados e intercalados por cores verdes e vermelhas criando um contraste complementar.

    Nas extremidades da coluna de baldes, pode-se notar ainda a colocação de espelhos que tem como função dinamizar o espaço criando uma sensação de penetração para além do infinito fazendo lembrar a grandeza da “colonne sans fin” (coluna sem fim) de Brancusi.

    O terceiro trabalho também parte de um trocadilho visual, desta vez, referente à obra “Roda de bicicleta” de Duchamp. Assim, o artista cria uma série composta por nove objetos distribuídos para ocupar o espaço uniformemente. Intitulada “Gugu Dadá”, a obra dialoga com elementos específicos do universo infantil, sobretudo, das periferias do Rio de Janeiro, encontrando no corpo do velotrol triciclo a matéria-prima ideal para construção de sua própria “roda” sobre banquinho. No universo boêmio, sagaz, jocoso e impregnado de questões urgentes sobre a vida e a arte, seria este um retorno indelével à infância das artes visuais? O certo é que brincando, brincando, Nivaldo nos oferta com uma obra tão boa quanto a que tem nos livros.


    Renata Gesomino
    Doutoranda na linha de História e Crítica da Arte pelo PPGAV-UFRJ

    JORGE SALOMÃO - Todas as manhãs

    MARCELLO VITIELLO - Plataformas Poéticas

    Plataforma III, 2012

    Plataforma IV, 2012
    Desde 2004, o pintor autodidata Marcello Vitiello vive e pinta entre a terra e o mar. Quinze dias reside em Macaé, sua terra natal. Quinze dias mora numa plataforma de petróleo, onde trabalha como fiscal de operações. Os temas de sua pintura abrigam tanto o repertório das paisagens, becos e ruas de Macaé, assim como as plataformas de petróleo, que hoje são tema recorrente em sua obra. Água, óleo, máquinas, tubulações fazem parte de um universo aparentemente inóspito, e compõe a natureza singular presente nas pinturas de Vitiello, especialmente na serie Plataformas. Seu método de trabalho nesta serie modificou sua forma de trabalhar as telas. Nos intervalos de sua jornada de afazeres, ele costuma parar para fotografar imagens e recortes que ele irá, posteriormente, pintar. Como ele próprio diz: “Pretendo pintar estas paisagens não de uma maneira de mera reprodução, mas para mostrar a atmosfera difícil e árdua do local com uma plástica visual particular”. A pintura deste artista revela, paradoxalmente, uma poética que visa o acolhimento, apesar do ambiente desolador das plataformas isoladas no oceano. A ideia da serie surgiu do contraste entre, a atmosfera azul do mar, com as pinturas das tubulações e luzes artificiais das plataformas. Vitiello declara: “que algo nesse ambiente de ilha” o incomodou e o fisgou com uma vontade de ação e criação. É importante notar, que o artista, também é um admirador de Edgar Allan Poe e de literatura fantástica. Assim como Poe, Vitiello reflete o simbolismo “da água”. Mas, as águas do pintor não são as mesmas “águas” do escritor. Suas “águas” pictóricas vibram no azul do inesperado mistério, que surge, no olhar do homem que frequenta uma ilha. Há uma prevalência do azul em suas telas, cor e presença marcante de um oceano forjado em cores fortes, enérgicas e luminosas.

    As estadias do artista em alto mar compõe um diário de viagem peculiar. Nas telas vibrantes desse diário percebe-se uma amorosidade ontológica pelos lugares, em especial, o ambiente confinado das plataformas – a ilha possível, composta por ferragens, reflexos e cores.


    América Cupello
    Fotógrafa, curadora e pesquisadora independente. Doutora em Artes Visuais pelo PPGAV – UFRJ.