sexta-feira, 3 de agosto de 2012

PERFIL - Cisko Diz


Herdeiro indireto de cartunistas como Brant Parker e Johnny Hart, Cisko Diz tornou-se uma espécie de Mago de Id da história em quadrinhos brasileira contemporânea. Tal qual o personagem medieval de Parker e Hart, capaz de desvelar a sabedoria alheia numa tirada de lucidez, Cisko é a surpresa que precede o riso, o risco que alimenta a invenção. Militante do bunker digital das HQs, fazendo experimentações com tiras, ilustrações e fotocolagens em sites como "CiskoToonz!" e "Os Filhos de Jorge", Cisko construiu uma reputação como artista gráfico a partir de um trabalho de invenção com cenas do cotidiano.




Seu arsenal cômico não precisa circular pelo plano da fantasia para encontrar matéria-prima: é da observação do dia a dia que o artista saca os argumentos para séries-piada como "Os Troglos", seu "Flintstones" versão brazuca. O gatilho para o chiste vem da percepção de Cisko para os sintomas da comédia humana, no que ela possui de mais patético (e nervosamente engraçado): a inveja, a gula, a intolerância e toda a sorte de pecados capitais e decapitados com o qual convivemos e pelos quais pagamos.

A habilidade maior de Cisko como narrador é propor uma síntese dos pequenos delitos nossos de cada segundo com poucos diálogos, poucos pontos e raras vírgulas. Texto é termo acessório na estrutura de contação de história que ele lapidou ao longo de sua experiência como desenhista, uma vez que sua obra prefere se expressar na infinita progressão aritmética da imagem: mais silêncio, mais reflexão, ainda que pelas veias provocaticas da ironia.



Na ativa desde 1991, Cisko nasceu carioca, 44 primaveras atrás, com nome de gente (como a gente): Marcos Francisco Cadena Diz. Abraçou a identidade secreta conforme passou a fazer arte, após formar-se em designer gráfico pela Estácio de Sá. Graças ao refinamento que adquiriu tentando falar muito com traços selecionados a conta-gotas, ele passou a fazer trânsitos pela indústria do audiovisual, produzindo storyboards para a TV e para o cinema. Até em animação se meteu, sempre à caça de um traço que não pagasse indulgências ao padrão Disney de desenho. Há mais Marcatti e Crumb nele do que Carl Barks. Ele está mais para o dadaísmo da caricatura do que para o classicismo das HQs para meninos e meninas bem-comportados.

Há cerca de cinco anos, sua invenção materializou-se no planalto para o que qualquer quadrinista sonha escalar: a criação de um grande personagem. Na linha fina do deboche, Cisko criou BrotherCop, o Pastor do Futuro, uma versão carola e carolíngia do tira metálico de Paul Verhoeven. Com seu pregador de lata, Cisko tirava troça com os bezerros de ouro da cultura brasileira que usam a fé como meio de exploração. O que era para ser mera tiração virou denúncia, retratando a ambição de Cisko em aproveitar brechas da normalidade para produzir dramaturgia no muque. E assim, de soco em soco, nocauteando o lugar comum, ele se firma como um dos grandes nomes do quadrinho no planisfério chamado Rio de Janeiro. E daqui parte para o alto e avante.


Rodrigo Fonseca
Crítico de cinema e escritor


Nenhum comentário:

Postar um comentário